“Quem não cuida dos seus índios não ama o solo que pisa”. É com essa frase que a fotografa Karla Calheiros descreve uma de suas fotografias, que faz parte da exposição “Gerinpakó – O ritual do menino do rancho”, aberta para visitação no Museu Palácio Floriano Peixoto até o dia 5 de maio.
Karla Calheiros apresenta de forma singela seus registros feitos durante o ritual do Menino do Rancho, realizado pelo povo indígena Geripankó, da etnia Pankararu, da aldeia localizada no município de Pariconha, alto sertão alagoano.
O rito celebra como forma de agradecimento a cura de alguma doença por um “encantado”, figura central da crença Pankararu, considerado a encarnação dos espíritos protetores da aldeia, que se torna o defensor e dono da criança. Na cerimônia, o menino é colocado no centro do rancho sagrado e cercado pelos praiás (protetores), que disputam com outros homens, para imunização do menino contra os males e sua inserção como membro da sociedade.
“Senti a necessidade de disseminar a existência do povo Geripankó através do registro dos seus ritos, das suas manifestações culturais de forma a valorizar a cultura indígena e romper com o preconceito gerado em torno das cerimônias religiosas indígenas”, disse a fotógrafa, na apresentação da mostra, que reúne 23 fotografias.
“O meu coração está nessa exposição. O que senti fazendo as fotografias é o quero passar para as pessoas. Como a fé é importante. Essa exposição é justamente sobre a fé, é sobre você acreditar. Cada fotografia foi tirada com muito amor e carinho, mostrando como o povo indígena é importante, que eles ainda existem e que sua cultura é riquíssima”, ressalta.
Os povos indígenas são grande fonte de conhecimento e uns dos principais responsáveis pela formação da cultura brasileira, que é tão diversificada, heterogênea e peculiar. Para Karla, esse valor e importância devem ser destacados. “Devemos valorizar o que a gente tem, porque amanhã podemos não ter mais nada para contar. Se não for passado de geração em geração, vai acabar. A vida está passando e levando os caciques e os mestres. Precisamos refletir sobre o que é essencial na vida, porque bens materiais a vida leva, mas o amor ao próximo e o bem que você planta, ninguém tira de você”, destacou.
Mesmo com as interferências do tempo, os índios lutam e resistem todos os dias para permanecerem na terra de seus antepassados, combatendo o preconceito e afirmando o valor de sua cultura. “A gente toma todo dia o espaço deles. Isso daqui é o mínimo que eu posso fazer por eles. Se cada pessoa fizesse um pouquinho, tudo seria diferente”, ressaltou.
“Falam que o índio é desconfiado, lógico que são. As pessoas são acostumadas a meter a mão em tudo que é deles. Elas querem que eles abram as portas de suas casas e digam entrem. Não é assim. Para fazer essa exposição, eu não cheguei simplesmente na aldeia e entrei. Eu pedi licença, pedi permissão ao cacique, ao pajé, não podia tirar fotos durante a cerimônia, tinha fotografias que eu não podia tirar durante o ritual. Tive que respeitar, porque sou intrusa. Eles estão fazendo o que sabem, é a cultura deles. Índio né bicho tangível não, eles têm sentimentos também”, frisou.
“Pedimos respeito. Somos todos irmãos, o que nos diferencia são as cicatrizes que o homem branco deixou sobre meu povo, mas a gente ergue a mente pedindo força para o grande espirito e dá continuidade a nossa jornada”, disse o cacique do grupo Dzubucuá, Ryaconan, da tribo Kariri Xocó, de Porto Real do Colégio, que visitou a exposição.
Geripankó
Localizados no município de Pariconha, os Gerinpakós, da etnia Pankararu, foram os primeiros povos indígenas a reivindicarem o reconhecimento em Alagoas. Segundo historiadores, eles começaram a ocupar a região alagoana no final do século XIX, por meio dos indígenas Zé Carapina e Izabel, que fugidos das tomadas de terras durante o Império e República, formaram uma nova comunidade, distanciando geograficamente e culturalmente dos brancos da região.