Após pedido da OAB, Tribunal de Justiça recomendou que juízes prorroguem medidas protetivas de urgência
Em meio à pandemia por coronavírus, centenas de mulheres são obrigadas a conviverem com seus agressores durante o período de isolamento social, imposto por governos locais com o intuito de evitar a propagação do vírus, mas se encontram diante de outra ameaça, uma ainda mais cruel, visível e, por vezes, inevitável: a violência doméstica.
Em Alagoas já são registrados diversos casos de feminicídio, mas o número de casos de violência doméstica teve um avanço durante a quarentena. Um fato bastante preocupante.
Diante da situação, a Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Alagoas (OAB) solicitou ao Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL) uma recomendação para que fossem prorrogadas medidas protetivas de urgência às mulheres em situação de violência.
O pedido formulado por meio da Comissão de Direitos Humanos (CDH) e da Comissão Especial da Mulher (CEM), foi acatado pelo TJAL, por meio de decisão da desembargadora Elisabeth Carvalho.
Para o presidente da OAB-AL, Nivaldo Barbosa Jr., a recomendação é uma medida importante para que as mulheres vítimas de violência estejam protegidas neste momento em que o ambiente doméstico é historicamente marcado pela vulnerabilidade feminina.
“É importante que as medidas protetivas sejam prorrogadas, para garantir às mulheres mais segurança. Infelizmente, o ambiente doméstico é o que deixa a mulher mais vulnerável, e precisamos garantir que, em casa, ela esteja protegida”, disse.
A presidente da CDH, Anne Caroline Fidélis, explicou o motivo do pedido encaminhado ao TJ-AL. “Quando analisamos as estatísticas de feminicídio em Alagoas observamos que muitas mulheres são assassinadas dentro de casa, tendo pessoas do seu círculo familiar como algozes. Sabendo disso e considerando o período de confinamento em virtude do novo coronavírus, entendemos ser essencial que medidas sejam tomadas por todos os órgãos para auxiliar mulheres a preservarem suas vidas. Além do ofício ao Tribunal de Justiça também enviamos uma série de solicitações à Secretaria de Segurança Pública, entre elas, a ampliação dos canais de denúncia às Delegacias e o aumento do efetivo da Patrulha Maria da Penha.”, explicou.
“Todas nós estamos atentas e estamos acompanhando de perto todos os casos. Infelizmente é uma triste realidade a mulher não ter segurança em sua própria casa. Mas, com essas recomendações dadas pelo Tribunal de Justiça, vamos conseguir diminuir essas estatísticas”, destacou a presidente da CEM, Caroline Leahy.
Recomendação TJAL
A Coordenadoria da Mulher do Tribunal de Justiça de Alagoas (TJAL) publicou, nesta segunda-feira (13), a Recomendação N° 01/2020, que orienta a necessidade de prorrogação dos prazos de vigência de medidas protetivas no estado. A recomendação é voltada para juízes criminais com competência em assuntos sobre violência doméstica e familiar contra a mulher. A recomendação foi assinada pela coordenadora estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar, desembargadora Elisabeth Carvalho.
A prorrogação se estenderá enquanto o Judiciário alagoano funcionar em regime de teletrabalho. Em caso de deferimento de pedidos de liberdade provisória ou de revogação de prisão preventiva onde os réus são comprovadamente integrantes dos grupos de risco do novo coronavírus, os magistrados deverão se atentar para a possibilidade de decretar medida cautelar de monitoramento eletrônico e/ou concessão de quaisquer outras medidas protetivas de urgência da Lei 11.343.
A notificação ou intimação da vítima acerca da concessão de soltura do agressor e/ou de qualquer ato processual pode ser feita por qualquer meio de comunicação, como estabelecido no enunciado n° 9 do Fórum Nacional de Juízes da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher (Fonavid).
Entre os objetivos, a recomendação visa proteger a vítima de violência doméstica e familiar, evitando a reiteração de condutas criminosas violadoras de sua dignidade e a necessidade de priorização do acesso à Justiça.
A Coordenadoria Estadual da Mulher é responsável pela elaboração de sugestões para o aprimoramento da estrutura do Poder Judiciário na área do combate à violência doméstica e familiar contra a mulher.
América Latina
Não é de hoje que o assunto é discutido e, infelizmente, é a dura realidade de milhares de mulheres do Brasil à fora. Registros apontam que a América Latina lidera os índices de feminicídio, sendo o lugar mais perigoso no mundo para se ser mulher.
A Argentina decretou a quarentena total do coronavírus em 20 de março e, desde esse dia até o final do mês, havia 9 femicídios, quase um por dia, que somam aos 60 registrados desde o início de março.
No Brasil, o país que mais mata mulheres na América Latina, as queixas por telefone aumentaram 17,97% nos nove dias seguintes à data em que o confinamento entrou em vigor em vários estados, segundo dados do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos.
E no Rio de Janeiro, uma das regiões que mais registra esse tipo de agressão, os pedidos de medidas restritivas aumentaram 50%.
Aumento da tensão
Valeria Caggiano, uma das porta-vozes do Intersocial Feminista, que agrupa 31 grupos feministas no Uruguai, esclarece que não é “durante a noite” que as casas se tornam violentas, mas que a tensão do confinamento faz com que as situações vão “se escalando”.
Na mesma linha, Teresa Herrera, presidente da Rede Uruguaia contra Violência Doméstica e Sexual (RUCVDS) diz que é “senso comum” entender por que o confinamento é “uma bomba-relógio” para mulheres e crianças vítimas de agressões e violência doméstica.
“Sabemos que entre a quarta e a quinta semana de isolamento é quando as coisas ficam mais complicadas, e é isso que queremos evitar”, acrescenta.