CALOTE – Governo federal deixa de pagar 25% dos precatórios em 2022

O governo federal não irá quitar todos os precatórios de 2022, incluindo os valores destinados aos segurados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). O Judiciário havia solicitado R$ 42,8 bilhões, mas o total liberado é de R$ 32,4 bilhões —75% do previsto. Precatórios são dívidas judiciais do governo acima de 60 salários mínimos. Para a Justiça Federal especificamente, que paga os precatórios do INSS, foram liberados R$ 25,4 bilhões. Os R$ 7 bilhões restantes são para outras áreas do Judiciário. Os números foram informados pelo CJF (Conselho da Justiça Federal) e pelo Ministério da Economia.

A redução do montante está amparada pelas emendas constitucionais 113 e 114, originadas da PEC (proposta de emenda à Constituição) dos Precatórios, que definiu um teto de pagamento para essas dívidas, fazendo com que parte dos cidadãos fique sem receber. O que não for pago em 2022 será incluído no Orçamento dos próximos anos, o que pode virar uma bola de neve. Do total de R$ 25,4 bilhões para a Justiça Federal, R$ 11,1 bilhões são para quitar dívidas judiciais de segurados do INSS que venceram ações de concessão ou revisão do benefício na Justiça. Na lista, estão benefícios previdenciários, como aposentadorias e pensão por morte; acidentários, como auxílio-doença e auxílio-acidente; e assistenciais, como BPC (Benefício de Prestação Continuada).

A aprovação da PEC com um limite para o pagamento dos precatórios até 2026 foi uma das formas encontradas pelo governo federal para furar o teto de gastos —já que parte das dívidas judiciais saem do teto— e encaminhar o dinheiro para o pagamento de outras despesas, como o Auxílio Brasil, substituto do Bolsa Família e aposta do governo Bolsonaro em ano eleitoral. Ainda não é possível saber quantos cidadãos entrarão na lista de recebimento dos precatórios neste ano. A definição de quem receberá sairá somente após o dia 10 de julho, quando os tribunais deverão fazer a divisão do dinheiro a ser enviado pelo CJF (Conselho da Justiça Federal). A previsão de depósito aos credores varia, em alguns tribunais será até o final de julho, em outros, no início de agosto.

A previsão inicial, segundo o CJF (Conselho da Justiça Federal), responsável por repassar os valores aos tribunais, era pagar R$ 14 bilhões em precatórios do INSS, atendendo a processos que estavam na lista divulgada pela CMO (Comissão Mista de Orçamento) em 2021. No entanto, o dinheiro liberado, de R$ 11,1 bilhões, é 80% do valor previsto. O corte também atinge ações de servidores contra a União em busca horas extras e verbas salariais não pagas. Do total previsto para 2022, estimado em R$ 10,8 bilhões, serão desembolsados R$ 9 bilhões para o pagamento, uma diminuição de 17% do previsto. Vitor Augusto Boari, presidente do Madeca (Movimento dos Advogados em Defesa dos Credores Alimentares do Poder Público) e membro efetivo da Comissão de Precatórios da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) em São Paulo, critica a falta de transparência.

“Esse dinheiro economizado pode estar sendo usado de uma forma espúria, porque vai para Orçamento secreto e para outras coisas que a gente vê. Foi o jeito que conseguiram de furar o teto e rolar a dívida.” O advogado destaca ainda outras mudanças feitas pela emenda, quer seriam prejudiciais aos credores: a da data-limite para que o precatório seja incluído no Orçamento do ano seguinte passou de 2 julho para 2 de abril, além da alteração na regra de correção, agora com base na taxa Selic. Antes, o índice utilizado era o IPCA-E (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – Especial).”Eles colocaram a Selic como indexador de todas as dúvidas. A Selic está em alta agora, mas, para valores anteriores, os credores estão tendo prejuízo de cerca de 35% do valor, segundo o Madeca”, afirma. Adriane Bramante, presidente do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), avalia que as emendas foram muito prejudiciais para os autores de ações judiciais que estão há anos esperando pelo recebimento do seu precatório.

“Os prejuízos são muitos, mas o principal é a espera ainda maior para receber o que lhes é de direito. Há processos com 10, 15 ou até 20 anos de espera e, agora, os segurados poderão ficar de fora da lista de 2022, ainda que tenham sido incluídos, caso a ordem deles esteja fora no limite orçamentário definido pelas emendas”, diz.No STF (Supremo Tribunal Federal), uma ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) questiona trechos da PEC dos Precatórios. Um pedido de liminar foi feito, mas ele ainda não foi apreciado. “Nós não solicitamos que a PEC seja declarada totalmente inconstitucional. Há trechos com os quais concordamos, como usar o precatório para comprar um imóvel, por exemplo. Nunca vimos acontecer, mas é uma alternativa para o credor”, diz Boari. Segundo a Justiça Federal, o pagamento obedecerá as regras de prioridades da emenda 114. Devem ser pagos prioritariamente os precatórios alimentícios, como os do INSS, além de salários e indenizações com limite de até três vezes o teto das RPvs (Requisições de Pequeno Valor) para quem tem a partir de 60 anos de idade ou seja pessoa com deficiência ou doença grave.

O limite, neste caso, será de R$ 218.160 neste ano. Depois, serão pagos os demais precatórios de natureza alimentícia, também limitados a até três vezes o valor da RPV de 2022, o que dá 180 salários mínimos. Em terceiro lugar vêm as demais dívidas alimentícias e, na sequência, os outros precatórios. Os TRFs (Tribunais Regionais Federais) aguardam os valores para determinar quem irá receber. Após 10 de julho, o cidadão poderá consultar, no site do tribunal de sua região, se seu precatório será quitado.

O TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região), que atende São Paulo e Mato Grosso do Sul, informou que receberá metade do valor previsto, mas que ainda haverá correções até a data de pagamento. Ao todo, foram solicitados R$ 8,7 bilhões para 2022 e devem ser liberados R$ 4,2 bilhões —total ainda sem correção. No TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região), que atende os estados do Sul, a previsão é pagar 48,02% dos precatórios federais que estavam previstos para 2022.Advogados de credores também podem ficar sem pagamento. Há entendimento de que eles também entram nas prioridades legais de idade, deficiência ou doença grave, mas há outras interpretações de que a verba dos profissionais não está amparada na regra constitucional.  (Folha de S.Paulo)

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