BRASIL – CIDH condena Estado brasileiro pelo desaparecimento de 11 jovens de Acari e determina medidas de reparação e investigação.

A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) condenou o Estado brasileiro pelo desaparecimento forçado de 11 jovens moradores da favela de Acari, na zona norte do Rio de Janeiro, em 1990. O caso, que deu origem ao grupo de ativistas Mães de Acari, teve sua sentença anunciada na quarta-feira (4) em San José, capital da Costa Rica, sede da CIDH.

A Corte Interamericana de Direitos Humanos é uma instituição judicial autônoma da Organização dos Estados Americanos (OEA) responsável por aplicar e interpretar a Convenção Americana, também conhecida como Pacto de San José da Costa Rica. O Brasil é um dos 20 países que reconhecem a competência da CIDH.

O desaparecimento dos 11 moradores de Acari ocorreu em 26 de julho de 1990, quando um grupo de aproximadamente seis homens encapuzados invadiu a casa da avó de uma das vítimas e os sequestrou enquanto estavam em um sítio em Magé, município da região metropolitana do Rio de Janeiro.

Os homens alegaram ser agentes da polícia e exigiram dinheiro, indicando ser membros dos “Cavalos Corredores”, um grupo de extermínio composto por policiais atuantes na Favela de Acari. Desde então, o paradeiro dos jovens permanece desconhecido.

A sentença da CIDH destacou que os jovens desaparecidos eram negros, sendo oito deles adolescentes com idades entre 13 e 18 anos. Até hoje, a maioria das famílias não obteve o direito à emissão das certidões de óbito das vítimas.

A decisão da corte internacional ressalta que um processo judicial no Brasil foi arquivado em 2011 por falta de “suporte probatório mínimo”. Além disso, a ação de reparação de danos materiais e morais movida por alguns familiares contra o Estado do Rio de Janeiro prescreveu.

Edmea da Silva Euzébio, mãe de um dos desaparecidos e líder das Mães de Acari, foi assassinada em 1993, logo após denunciar à Justiça a participação de policiais nos desaparecimentos, juntamente com uma sobrinha que a acompanhava.

As Mães de Acari, movimento que ganhou notoriedade por exigir avanço nas investigações e responsabilização pelo crime, continuam sua luta até os dias atuais. Em abril deste ano, os policiais acusados pelo crime foram absolvidos por falta de provas.

Os juízes da CIDH consideraram o Estado brasileiro responsável pela violação dos direitos ao reconhecimento à personalidade jurídica, à vida, à integridade pessoal e à liberdade pessoal. A corte enfatizou que o Estado não realizou uma investigação séria, objetiva e efetiva para determinar a verdade sobre o caso.

A CIDH determinou que o Estado brasileiro adote medidas como continuar a investigação do desaparecimento, realizar uma busca rigorosa do paradeiro dos jovens, realizar um ato público de reconhecimento de responsabilidade internacional, criar um espaço de memória em Acari, proporcionar atendimento médico e psicológico adequado às famílias, reparação financeira às vítimas e elaborar um estudo sobre a atuação de milícias e grupos de extermínio no Rio de Janeiro.

A sentença da CIDH foi recebida com sentimentos mistos pelas famílias das vítimas. Para alguns, como Rosangela da Silva e Aline Leite de Souza, parentes de vítimas, a decisão representa um renascimento e uma oportunidade de justiça para aqueles que sofreram por décadas sem respostas.

A coordenadora-geral da ONG Criola, Lúcia Xavier, destacou a importância da decisão da CIDH como uma correção dos rumos da política do Estado contra violências desse tipo. O advogado Guilherme Pimentel, da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, classificou a sentença como um marco na luta pelos direitos humanos no Brasil.

Em resposta à sentença histórica da CIDH, o Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania afirmou seu compromisso em implementar integralmente a decisão e destacou a importância do Brasil respeitar os direitos humanos em sua totalidade.

A Secretaria estadual de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos do Rio de Janeiro informou que está acompanhando o caso desde o início, oferecendo suporte às famílias das vítimas e adotando medidas para cumprir as determinações da CIDH.

A Polícia Civil do Rio de Janeiro, responsável pelas investigações, ainda não se pronunciou sobre a sentença da CIDH. A decisão, que representa um avanço na busca por justiça e reparação para as famílias das vítimas, ressalta a importância de combater violações de direitos humanos e fortalecer as políticas de segurança e cuidado no Brasil.

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