E AGORA JOSÉ: Rui Palmeira afirma que não há como realocar todos moradores atingidos por rachaduras

Em entrevista ao Jornal O Estado de São Paulo, o prefeito Rui Palmeira afirmou que não há como realocar todas os moradores atingidos pelas rachaduras nos bairros do Pinheiro, Mutange, Bebedouro e Bom Parto.

A afirmação foi feita quando questionado sobre a remoção dos moradores das áreas de risco. “Tenho a esperança de que não vai ser necessário evacuar toda a região, porque não tem área para levar (todas as pessoas), não tem casa suficiente, não tem estrutura para isso”, afirmou o gestor.

Desde fevereiro do ano passado, Maceió convive com o agravamento das rachaduras e o afundamento que atingem, atualmente, quatro bairros e afetam mais de 40 mil pessoas. A capital alagoana terá o desafio de evacuar uma região equivalente a 78 campos de futebol em uma área de risco que engloba hospitais, escolas, uma subestação de energia elétrica que abastece um terço da cidade e o trecho de uma linha de trem urbano, segundo relatório de agências do Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil.

O prefeito criticou ainda a falta de fiscalização da atividade da empresa pela Agência Nacional de Mineração (ANM). Procurada por e-mail, a agência não se manifestou.

A seguir, os principais trechos da entrevista com o prefeito de Maceió:

*

Um relatório de agências do Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil apontou que uma área de 78 hectares terá de ser evacuada em Maceió. Como deve funcionar esse trabalho e o que será feito para minimizar o impacto para os moradores dos bairros afetados?

É uma questão altamente complexa que a cidade sozinha não tem condições de enfrentar. O município tem feito muita coisa. A gente transferiu a Defesa Civil para o bairro, estamos cumprindo o que nos é determinado. Há aproximadamente 1.800 famílias em uma área de encosta no Mutange e no Jardim Alagoas que são foco da nossa remoção, que tem de ser o mais célere possível. Há 750 casas do Minha Casa Minha Vida e, até o final de janeiro, teremos outros 500 apartamentos prontos. Isso conseguiria solucionar 80% dessa área mais crítica. Essa sempre foi uma área de risco, quase todo ano tem alguma intercorrência lá. Como é naturalmente frágil e está dentro da área de risco, é o foco principal, mas a gente precisa de uma portaria do Ministério do Desenvolvimento Regional flexibilizando os critérios do Minha Casa Minha Vida, porque tem pessoas que podem ter renda acima da faixa um (até R$ 1,8 mil). Hoje, estamos aguardando essa definição e temos uma interlocução muito boa com o governo. Nossa vontade era tirar para ontem.

Qual o impacto do desastre em andamento para a cidade de Maceió?

Primeiro, tem o impacto psicológico nessas famílias. O Pinheiro é um bairro tradicional, mesclado no sentido social, e tem famílias que moravam há 40 anos, tiveram filhos e netos lá e, da noite para o dia, ficaram sabendo que não poderiam mais ficar em suas casas. Há 3 mil famílias que estão fora de casa recebendo ajuda humanitária. Para o município, tem a questão financeira. Assinamos um projeto de lei abrindo mão de receber os tributos, taxas como IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e ISS (Imposto sobre Serviços) do comércio. Há um peso financeiro e a cidade já vive em um aperto desde sempre.

Qual o valor estimado desse prejuízo financeiro?

De lançamento de tributos, estimamos R$ 20 milhões por ano. Isso de recursos de taxa de lixo, IPTU. Esses são os tributos lançados, não necessariamente arrecadados.

O que deve ser feito com a área atingida pelo problema?

Precisamos de definições da Defesa Civil Nacional. Estamos atuando nas áreas encaradas como mais graves. Já solicitamos ao Ministério de Minas e Energia um estudo para ver a viabilidade de presença das pessoas nessa área e se há esperança para voltar à normalidade nesses locais.

A partir de quando as pessoas serão removidas da área de risco? Para onde os moradores serão remanejados? Maceió tem casas para alugar disponíveis para todo esse volume de pessoas?

Não encaro que a totalidade precise ser evacuada. Vamos, paulatinamente, fazendo as remoções quando for necessário. Montamos um sismógrafo para acompanhar a situação na região e estamos acatando as recomendações que vêm da Defesa Civil Nacional. Tenho a esperança de que não vai ser necessário evacuar toda a região, porque não tem área para levar (todas as pessoas), não tem casa suficiente, não tem estrutura para isso.

A área de risco engloba hospitais e escolas públicos e privados. Qual o impacto dessa tragédia para o atendimento de pacientes e estudantes? Como reverter a perda de leitos e de vagas em escolas?

No caso do município, tínhamos duas unidades de saúde que foram transferidas e duas escolas municipais que também foram para uma localidade próxima que não está na área atingida. Uma das escolas tinha passado por uma grande reforma há um ano. Isso é muito triste. Tem dois grandes hospitais, um privado e o Hospital Sanatório, que atende pacientes de todo o Estado. Por ser uma entidade filantrópica, terá dificuldade para construir outro hospital.

Qual o impacto para a economia local, tendo em vista que o comércio desses bairros está sendo afetado?

Tudo parou. Como o bairro está esvaziado, o comércio sofreu forte impacto. Tinha um comércio local forte na região. Muita gente teve de fechar as portas, porque perdeu a clientela.

E para a população? Os relatos são de moradores que estão à base de medicamentos e que há aumento de suicídios…

Nós disponibilizamos apoio psicossocial desde o primeiro momento, mas é algo muito sério e não se vê uma solução em curto prazo no horizonte. Há a incerteza de saber se vai ser possível ou não voltar a morar no local. Isso afeta totalmente a população. É a questão mais grave. Os suicídios não chegaram ao meu conhecimento.

A gestão municipal estuda pedir indenização à Braskem?

Estamos trabalhando com a nossa equipe jurídica. A Procuradoria-Geral do Município está trabalhando na questão. Não é justo que a população pague. A causadora do dano terá de pagar. Sabemos que é uma questão que será judicializada, mas é um direito líquido e certo, porque houve prejuízo nos equipamentos públicos. Vamos solicitar toda a parte de tributos, dos equipamentos que desocupamos, de toda rede de drenagem e asfalto. Não verei o resultado, até porque estou indo para o meu último ano (de gestão).

O prefeito de uma capital costuma enfrentar muitos desafios. Como tem sido lidar com essa situação?

A gente vem trabalhando lá, fazendo estudos. Fizemos, primeiramente, um trabalho com a Universidade Federal de Alagoas (UFAL) e, depois, com a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). No momento em que sentei com o então diretor da Defesa Civil Nacional e ele falou que era preciso decretar situação de calamidade, nós decretamos, mesmo sabendo que isso gera especulações. A população sofre muito com fake news, com os interesses político-eleitorais. Isso acaba causando mais pânico. É o maior desafio com o qual me deparei e não tem perspectiva de solução. É a maior remoção populacional por causas não-naturais que eu tenho conhecimento no Brasil.

O Plano de Ação Integrado fala em ações de preparação e resposta em caso de um desastre súbito na área. É possível que isso ocorra na região?

Não quero crer que isso venha a acontecer, mas, sempre que vem uma determinação da Defesa Civil, a gente acata. Vamos fazer a remoção o mais rápido possível.

A Braskem anunciou a remoção de 400 imóveis no entorno dos seus poços. O senhor acredita que mais moradores deveriam ser retirados pela empresa, tendo em vista que o PAI fala em evacuação de 2.114 imóveis?

Eu acho que não é razoável a empresa tirar só 400 enquanto a gente enfrenta problemas burocráticos. É muito difícil. A Braskem deveria auxiliar o município na retirada na encosta do Mutange. O importante era o governo federal ou a própria Braskem bancar o estudo para ver a viabilidade para a permanência nos bairros, para saber se é possível parar a subsidência (afundamento). A gente tem de cobrar a responsabilidade da Braskem, porque é preciso que a empresa não só remova (no entorno dos poços), mas apoie o município na remoção dos demais moradores. Foi por causa da Braskem e falta de fiscalização da Agência Nacional de Mineração (ANM) que isso aconteceu. As tragédias de Mariana e Brumadinho já mostraram que a ANM não fiscaliza coisa nenhuma. A responsabilidade é da empresa e da ANM.

(Redação com Terra e O Estado de São Paulo)

Botão Voltar ao topo